18 de dez. de 2009

A CHUVA MADRINHA!


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A CHUVA MADRINHA! (Crônica de humor)

Duas mulheres. Irmãs e amigas que se amam. O riso solto, alegria reinando na conversa fiada e calorosa. Uma delas diz:

- Hoje acordei, olhei para chuva e não consegui parar de rir. Lembrei-me da sua primeira madrinha, você lembra?

- Da chuva? Sim, a primeira a gente nunca esquece! – A caçula do outro lado da cidade pelo telefone, ria junto com a lembrança.

- Sinto tanta saudade de você, das nossas brincadeiras, dos nossos irmãos todos... – A voz saiu quase chorada, aquele nó sufocante impedia de continuar a conversa. Mudou rapidamente o assunto para não estragar aquele momento feliz. Era apenas recordações e a distância entre elas sempre parecia mais distante quando conversavam ao telefone.

- Logo estaremos juntas, beijos! – Consolou a caçula.

- Sim, beijoquinhas querida. – Despediu-se.

A filha que estava perto, depois que a mãe desligou o telefone, curiosa que só ela, perguntou:

- Mãe, por que você ria tanto no telefone com a tia?

- Senta aqui, querida, vou contar o motivo de tanta risada...

Ao lado da mãe que disfarçava os olhos marejados, foi ouvindo:

- Em nossa casa todos fomos batizados na igreja, menos a tia Bia porque papai queria que a mãe dele a batizasse. Como a nossa avó morava em outro estado e nunca que vinha, a minha irmã ia crescendo sem as bênçãos do batismo. E sempre as tias da nossa mãe e as beatas da igreja diziam:

“- Olha, Maria, precisa batizar essa menina logo antes que o diabo se aposse dela!”

- Pra quê eu fui ouvir aquelas palavras, minha filha! Daquele dia em diante nunca mais consegui dormir em paz ao lado da sua tia Bia. Lembro que eu suava a noite por dormir com a cabeça coberta em pleno verão com medo que minha irmã ficasse possuída pelo demônio e fosse para cima de mim me atacar.

A filha interrompeu a mãe dando risada:

- Ha, ha, ha... Mãe, você acreditava mesmo nisso? Quantos anos vocês tinham nessa época?

- Acho que em todo o bairro eu era a menina mais medrosa e impressionável que já existiu naquela época! Eu tinha nove anos e minha irmã, seis. – Respondeu a mãe às gargalhadas.

E a mãe prosseguiu com o relato:

- O medo aumentou depois que assisti ao filme em 1973, O Exorcista. Minha filha, o medo era tanto que teve uma noite que senti a cama levitar. Comecei a chorar, a gritar tanto que acordei todos os meus irmãos! No dia seguinte determinei que encontraria um jeito de acabar com aquele sufoco, pois até pela manhã eu já temia só em ficar ao lado da minha irmã caçula “pagã”.

Como tinha uma cabeça bem pensante, eu ficava horas matutando ideias para livrar minha irmãzinha das garras do “bicho ruim”, como costumávamos chamar o diabo. Nenhum dos irmãos se atrevia a pronunciar “diabo, capeta, demônios” ou similares, com receio dele achar que estávamos convidando para entrar em nossa casa. Então, quando queríamos nos referir a ele, era "coisa ruim" mesmo.

A filha acompanhava a narração da mãe com olhos atentos, quase sem piscar. Parecia mesmo interessada. E continuou ouvindo:

- Bem, querida, finalmente um luz divina clareou-me as ideias naquela tarde de chuva de verão. Segurei minha irmãzinha pela mão, a levei para o quintal e disse... “Bia, hoje eu vou batizar você”.

Debaixo de chuva eu proclamei as mesmas palavras proferidas pelo padre no dia do meu batismo. “Bia, a partir de hoje a Chuva será a sua madrinha, você aceita?”. Aos seis anos de idade, depois de tê-la amedrontado com os absurdos das possessões demoníacas, claro que ela aceitaria qualquer batismo! Com seu consentimento, finalizei dizendo, “eu te batizo em nome do Pai, do Filho, do Espírito Santo. E ordenei, "agora tome a bênção para sua madrinha, Bia!”

- Ha, ha, ha... Você não fez isso, mãe!!! Duvidou a filha quase chorando de rir.

A mãe rindo junto, respondeu:

- Com toda pureza de um coração de criança medrosa, fiz tudo o que acabo de lhe contar, querida! Medo e cabeça de menina fazem coisas que a razão não controla!

- Mãe, muito show! Você é muito divertida, sabia?

- E você sabe, meu bem que até hoje a Bia pede bênção para a chuva?

As duas riram vendo a Chuva Madrinha cair abençoando a tarde para na manhã seguinte abrir flores encantadoramente belas.


Eu, minha irmã (a afilhada da Chuva Madrinha...rs)
com nosso sobrinho Rafael, há 21 anos atrás...rs
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